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CVM investiga se houve fraude na Oi

30/10/2014 às 05h00 3

Valor Econômico - Por Graziella Valenti | De São Paulo

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) investiga se alguém dentro da Oi sabia sobre a aplicação de € 897 milhões, feita pela Portugal Telecom (PT), em 'commercial papers' da Rioforte, holding do Grupo Espírito Santo (GES). Mais do que saciar a gana dos investidores em 'eleger' culpados, a investigação pode levar ao primeiro processo de fraude em oferta pública de ações no Brasil - e numa transação bilionária.

Esta é uma entre muitas análises que CVM vem realizando na reorganização anunciada pela Oi em 2 de outubro de 2013, e que previa a fusão com a PT. A questão se coloca porque a Oi captou R$ 8,2 bilhões no mercado, sem que os papéis da Rioforte fossem conhecidos pelos investidores. A operação levou à perda integral do valor emprestado ao GES, quase R$ 3 bilhões.

A investigação é coordenada pela área técnica da autarquia e vem sendo feita em conjunto com o regulador americano, a Securities and Exchange Commission (SEC), já que a oferta foi global e seguiu também as leis americanas.

Consultada, a SEC disse que não comenta investigações, feitas de forma privada. A CVM também não comentou, só lembrou do convênio de cooperação com a SEC. A Oi não se pronunciou.

A Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), de Portugal, também está colaborando. O foco do regulador português, porém, é a relação entre o Banco Espírito Santo (BES) e a PT.

A instituição financeira tem longa parceria com a operadora e era sua principal acionista, com 10% do capital. Assim como a PT aplicava seu caixa no BES - não se conhecia o uso de outros veículos -, o banco foi a âncora financeira em momentos como a compra da Telesp Celular e a virada após a oferta hostil do Sonae.com, em 2006.

A CVM está terminando de analisar as comunicações internas da Oi, conforme apurou o Valor.

A investigação é a etapa anterior à acusação e, portanto, ao processo sancionador. Por enquanto, a autarquia está verificando se houve ou não falhas. Caso nem CVM nem SEC encontrem fraude, a Oi será tão vítima do episódio quanto seus investidores.

Mas, se os reguladores descobrirem que algum administrador - em especial executivos - da Oi sabiam da Rioforte, pode se configurar uma fraude. A qualidade e veracidade das informações da Oi e da PT no prospecto da oferta estariam comprometidas.

Numa oferta de ações, há um procedimento chamado "bring down due dilligence", que cobre o lapso temporal entre o balanço avaliado pelos auditores e o momento da captação. Trata-se de uma conversa gravada entre os administradores da empresa e os auditores, com a presença de advogados, para garantir a inexistência de dados que deveriam ser públicos, com potencial de afetar a decisão do mercado. A questão é que Rioforte vinha da PT e não da Oi, a emissora das ações.

O artigo 56 da Instrução 400 da CVM regula oferta pública. O emissor - Oi e administradores - é responsável pela "veracidade, consistência, qualidade e suficiência das informações" prestadas para a tomada de decisão do mercado. Ao banco líder, no caso o BTG Pactual, cabe tomar as medidas necessárias para a empresa cumprir os deveres.

Em abril, a Oi fez um aumento de capital de R$ 13,9 bilhões. Deste total, R$ 5,7 bilhões vieram do aporte da PT na tele brasileira, conforme laudo do Santander. Os outros R$ 8,2 bilhões foram levantados na oferta pública. Trata-se de uma única emissão, mas com aportes simultâneos - parte em dinheiro, parte em ativos.

A PT chegou à Oi simultaneamente à realização da oferta e já com os papéis da Rioforte. A reestruturação tinha diversos passos simultâneos. Até então, a gestão da PT era independente. Durante as apresentações aos investidores, o chamado "road show", a grande estrela era Zeinal Bava, então presidente da Oi e que apresentava o plano para os negócios. Mas Luis Pacheco Mello, diretor financeiro da PT na época, participava para falar da operação portuguesa.

A oferta da Oi muda completamente o olhar dos reguladores sobre o episódio da Rioforte. O investidor forneceu recursos para um plano em que haveria uma fusão de PT e Oi, com sinergias de R$ 5,5 bilhões e que colocaria a companhia numa posição clara de potencial consolidadora do setor no Brasil. A estrutura societária, antes um peso aos negócios, seria um trunfo de flexibilidade. A nova Oi seria uma companhia do Novo Mercado, sem dono e sem acordo de acionistas, pulverizada em bolsa.

Agora, o investidor tem uma companhia com planos de curto prazo e muito diferentes, R$ 3 bilhões a menos em caixa, sem sequer um presidente definitivo e com a migração ao Novo Mercado atrasada. O desgaste pela aplicação da PT no GES levou Bava a deixar a Oi. O diretor financeiro e de relações com investidores, Bayard Gontijo, assumiu interinamente.

Da oferta, R$ 7,5 bilhões ficaram divididos na cobertura das dívidas dos antigos donos brasileiros - R$ 4,5 bilhões - e no rombo de R$ 3 bilhões da Rioforte.

A própria fusão sofreu ajustes nas condições societárias, como compensação. A fatia dos acionistas portugueses na nova Oi inicialmente planejada para 37,4% e baixou para 25,6%.

Por fim, a união com a PT nasce morta. Brasileiros e portugueses estão de costas uns aos outros. A Oi avalia vender a tele portuguesa para reduzir a dívida líquida de R$ 46 bilhões, que custa R$ 4,5 bilhões por ano aos cofres da tele. Pouco restou do plano inicial.

Diz a Instrução 8, da CVM: operação fraudulenta é "aquela em que se utilize ardil ou artifício destinado a induzir ou manter terceiros em erro, com a finalidade de se obter vantagem ilícita de natureza patrimonial para as partes, para o intermediário ou para terceiros".

Seria o primeiro caso no Brasil. E uma das maiores perdas ao mercado já avaliadas. A punição para operações que geram prejuízo passam pelo ressarcimento dos investidores. Até o momento, a Oi perdeu os R$ 3 bilhões do caixa.

Considerando o valor de mercado da operadora, o saldo é negativo em R$ 8,5 bilhões. A companhia era avaliada em R$ 18,6 bilhões antes do escândalo com o GES vir à tona - e fechou ontem em pouco mais de R$ 10 bilhões.

Caso se verifique fraude da Oi, a companhia, junto com os administradores responsáveis, terão de compensar os acionistas.

Nos EUA, se for provada a fraude, a companhia ou o banco deve devolver o valor captado aos investidores, com a recomprar das ações pelo preço da oferta.

A despeito das fotografias serem tão diferentes (o plano da Oi levado ao mercado e a realidade atual), provar a fraude não é tão simples. É preciso mostrar mais do que ciência das aplicações na Rioforte: a consciência sobre o risco.

O conselho da PT contratou a auditoria da Price (PwC) para elaborar um relatório sobre as relações com o BES e os envolvidos. Em 25 de agosto, a PT declarou que tinha saldos ou transações com mais de 20 entidades do GES.

Investimentos de curto prazo com o caixa da PT não eram novidade. O balanço de 2013 mostra aplicações de € 750 milhões (frente a € 510 milhões do ano anterior) com maturidade de dois meses. Mais tarde, a empresa veio a declarar que até fevereiro todas foram pagas - principal e juros. Mas antes não havia explicação sobre os papéis. Muito menos justificativa para 30% do caixa disponível estar alocado em títulos de curto prazo.

A nota explicativa 24 do balanço da PT limitava-se a informar que eram aplicações da PT Finance - subsidiária financeira da tele. Tal empresa era o muro de informações nas quais parava a visibilidade do investidor de mercado.

 

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