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notícias Caso Madoff – Agência reguladora americana reconhece sua parcela de culpa


Caso Madoff – Agência reguladora americana reconhece sua parcela de culpa

 

Por Transparência e Governança

Um dos maiores casos de fraude dos Estados Unidos é a pirâmide financeira de Bernard Madoff, ex-chairman da Nasdaq. Também conhecida como Esquema Ponzi, ocorreu por repetidas falhas do regulador do mercado Norte Americano, a Securities and Exchange Comission (SEC), agência com atividades semelhantes à Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Houve contudo uma intensa investigação por parte da própria SEC para entender como ocorreram as falhas na fiscalização e na investigação do caso. A SEC já havia sido alertada repetidas vezes ao longo dos anos anteriores a dezembro de 2008, quando o escândalo veio à tona.  Ademais, vale ressaltar que a investigação feita pela SEC sobre suas falhas foi conduzida em apenas nove meses e seus resultados foram publicados e analisados em fórum público. As falhas internas custaram os cargos dos envolvidos na fiscalização, incluindo o diretor presidente da agência na época.  O relatório completo está à disposição do público (clique aqui para acessá-lo) e vale a leitura do seu sumário executivo às páginas 20 a 41 do extenso e detalhado documento. 

A SEC começou a receber denúncias e pedidos de investigações 16 anos antes, a partir de 1992, mas as reclamações detalhadas não motivaram os diversos departamentos da agência a iniciar uma apuração mais profunda.  Embora as reclamações continham informações minuciosas, esses relatórios de denúncias e reclamações que chegavam aos funcionários da SEC nunca foram analisadas pelo regulador.  Os investigadores da SEC sequer solicitaram informações de outras fontes para apurar as alegações dos denunciantes. A checagem poderia ter sido feita com a DTC, câmara de custódia de títulos equivalente à CBLC brasileira, ou mesmo com as corretoras que supostamente atuavam junto aos fundos geridos por Madoff. 

Uma reclamação apresentada por um gestor em 2005 chegou a intitular a renúncia entregue à agência assim: “O maior fundo de hedge do mundo é uma fraude”. O documento continha 30 observações indicando que Madoff estava operando um esquema tipo Ponzi.   As investigações feitas por agentes da SEC falharam quando simplesmente ficaram satisfeitos com as informações obtidas diretamente com próprio Madoff. Não houve questionamentos detalhados ou verificações com outras fontes se aqueles dados eram verídicos ou não.  Respostas que continham dados completamente inconsistentes ou explicações sem sentido também foram ignoradas pela SEC. 

Os agentes reguladores não questionaram pontos óbvios, tais como o fato de o auditor do fundo ser parte relacionada, ou porque o volume de operações informadas era inconsistente com as transações realizadas em mercado.  Dados de negociação não foram solicitados porque departamentos da SEC não estavam equipados ou não possuíam o conhecimento adequado para analisá-los. Além disso, várias pessoas envolvidas na fiscalização eram inexperientes em questões de mercado e sequer haviam participado de outras investigações do gênero.  As investigações e análises feitas pela equipe que cuidou do caso centraram-se em questões rasas, tais como a adequada linguagem a ser usada nas informações (disclosure) e na necessidade de registro por parte dos fundos. Nunca se ativeram aos indícios de que era necessária uma investigação mais profunda dado que os fundos Madoff apresentavam retornos estáveis e inconsistentes com a estratégia anunciada ou mesmo com o mercado, o que já evidenciava a suspeira da existência do esquema Ponzi. 

Explicações dadas por Madoff diretamente aos funcionários da SEC foram aceitas sem questionamento, mesmo sendo inconsistentes.  Funcionários menos graduados foram alertados para o fato de que Bernard Madoff “era muito bem conectado, uma pessoa muito poderosa” e assim acabaram desencorajados para se aprofundar nas investigações, que ficou concentrada apenas em informações apresentadas pelo próprio Madoff, incluindo documentos forjados por ele mesmo com claras inconsistências e erros. 

A pirâmide financeira conduzida por Madoff foi uma fraude estimada em aproximadamente US$15 bilhões.  O Brasil não está imune a esse tipo de fraude ou à ocorrência das falhas semelhantes em processos de investigação e fiscalização.  Vale aprendermos as lições do caso Madoff, pois aqui já houve casos correlatos como os da Fazendas Reunidas Boi Gordo S.A. e Avestruz Master. No caso Boi Gordo,  várias emissões de CICs e outros instrumentos foram revisadas e registradas pela CVM em 1999, 2000 e 2001 – ou seja receberam registro para serem distribuídas ao público investidor.  No final de 2003, o Colegiado da CVM suspendeu, por 20 anos, Paulo Roberto de Andrade, o controlador do “Boi Gordo”. O empresário não pode nesse período exercer qualquer cargo de administrador em companhia aberta. Outros dois diretores sofreram punição semelhante, mas por apenas 5 anos.

Informações públicas sugerem que nenhum dos acusados no caso “Boi Gordo” sofreu qualquer punição criminal no âmbito da Justiça.  Já Bernard Madoff foi condenado pela Justiça de Nova York em 2009 a ficar na prisão por 150 anos.  A CVM tem a difícil missão de fiscalização e vigilância e de, ao mesmo tempo, ser rápida e efetiva na solução de casos. Precisa ainda checar dados oferecidos em denúncias com fontes independentes e não se intimidar diante de pessoas poderosas.  O caso Madoff serve de alerta para todos os reguladores de mercado de capitais no mundo.

 


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